Dificuldades Alimentares na Infância: quando é preciso procurar ajuda especializada?
*Por Dra. Denise Swei Lo & Dra. Fabíola Custódio Flabiano Almeida
A dificuldade alimentar na infância é uma queixa muito comum de pais do mundo todo. Para muitas famílias, o momento da refeição é um verdadeiro campo de batalha, em que os pais assumem a árdua tarefa de alimentar uma criança que se recusa terminantemente a comer. E o que era para ser um momento tranquilo e prazeroso se torna o pior momento do dia, carregado de estresse, frustração, muita angústia e preocupação.
É comum que as crianças se recusem a comer ocasionalmente, por algum motivo específico (porque estão cansadas, doentes ou enjoadas). Mas depois de um curto período de tempo, voltam a se alimentar bem e acabam alternando períodos de baixa ingesta e seletividade, com períodos de maior aceitação de alimentos saudáveis e nutritivos. É muito comum também a criança comer melhor em uma refeição e não comer tão bem na outra; ou comer melhor em um dia e pouco no outro. Todas essas variações fazem parte do desenvolvimento normal e, se a criança está mantendo um ritmo adequado de crescimento e ganho de peso, não há motivo para preocupação.
As crianças com dificuldades alimentares de que trataremos neste artigo são crianças que se recusam a comer em praticamente todas as refeições, que comem uma variedade muito restrita de alimentos, que não aceitam alimentos de determinada consistência, que nauseiam ou engasgam com a comida em quase todas as refeições, que choram desesperadamente logo que são colocadas no cadeirão ou na mesa para comer. Estamos falando de aproximadamente 30% das crianças com desenvolvimento normal e de até 80% das crianças com alguma desordem do desenvolvimento (como síndromes genéticas, transtorno do espectro do autismo ou neuropatias).
A dificuldade alimentar pode acontecer com qualquer bebê ou criança em qualquer momento durante a infância. Por isso, é preciso estar atento aos primeiros sinais de dificuldade alimentar, para que a criança tenha oportunidade de iniciar o tratamento adequado, o mais precocemente possível, diminuindo o tempo de intervenção e minimizando os impactos negativos da dificuldade alimentar na vida da criança e de sua família.
SÃO SINAIS DE ALERTA PARA A DIFICULDADE ALIMENTAR QUANDO:
🍴 a criança não aceita se alimentar ou aceita quantidade e/ou variedade insuficiente para atender às suas necessidades básicas de nutrição, hidratação e crescimento por um período maior que um mês;
🍴 a criança apresenta dificuldades para aceitar alimentos na consistência de purê durante o início da introdução alimentar que persiste para além dos 8 meses de idade;
🍴 a criança apresenta náuseas e/ou vômitos frequentes durante a introdução da alimentação complementar;
🍴 a criança apresenta dificuldades para aceitar e lidar com pedaços a partir dos 8 meses de idade (nauseia, engasga ou cospe os pedaços de sólidos macios);
🍴 a criança apresenta tosse, náuseas, engasgos e/ou vômitos com frequência durante ou após a alimentação;
🍴 a criança apresenta falta de interesse para comer, não demonstra sinais de fome, mesmo estando há várias horas sem comer;
🍴 a criança não tolera determinadas texturas e/ou rejeita grupos inteiros de alimentos (por exemplo, não aceita nenhum tipo de fruta ou nenhum tipo de carne);
🍴 a criança apresenta náuseas só de ver, sentir o cheiro ou tocar determinados alimentos;
🍴 a criança apresenta “birras” e constantes comportamentos de fuga durante as situações de alimentação;
🍴 a situação de alimentação gera angústia, ansiedade, estresse a ponto de interferir no relacionamento familiar e/ou há impacto social.
Geralmente, quando a criança tem alguma condição de risco para a dificuldade alimentar (bebês prematuros, bebês com síndromes genéticas ou neurológicas, entre outras condições médicas complexas), tanto pais quanto profissionais costumam ficar atentos aos sinais. No entanto, quando se trata da criança com desenvolvimento típico, os primeiros sinais de dificuldade alimentar muitas vezes são ignorados e perde-se um tempo precioso na espera de que essa fase logo irá passar. Ou ainda, a dificuldade alimentar é interpretada como “mau comportamento”, como se a criança estivesse se recusando a comer para testar ou manipular os pais.
Contudo, as pesquisas mostram que apenas uma pequena parcela das crianças realmente usa o não comer para chamar a atenção dos pais. A grande maioria das crianças com dificuldades alimentares não comem porque, para elas, comer pode ser muito difícil e desafiador. Seja porque comer as faz sentir dor, seja porque comer as faz sentir um enorme desconforto gastrointestinal, seja porque determinados cheiros e texturas lhes são muito aversivos, seja porque elas ainda não têm habilidades motoras-orais adequadas para mastigar e engolir determinado alimento, seja porque elas têm muito medo de comer por conta de algum episódio desagradável que as levou a perceber o alimento como algo perigoso e ameaçador.
Na suspeita de uma dificuldade alimentar, converse com seu médico e procure um profissional especializado! Quanto antes a dificuldade alimentar for identificada e diagnosticada, maiores são as chances de sucesso no tratamento.
Referências Bibliográficas:
- Rowell K, McGlothlin. Helping your Child with Extreme Picky Eating – A step by step guide for overcoming selective eating, food aversion and feeding disorders. Raincoast Books, 2015.
- Smith AD, Herle M, Fildes A, et al. Food fussiness and food neophobia share a common etiology in early childhood. Journal of Child Pshychology and Psychiatry. 2017; 58(2): 113-217.
*Denise Swei Lo é médica pediatra (CRM: 75.590), chefe da Enfermaria de Pediatria do Hospital Universitário da USP e coordenadora da Residência Médica em Pediatria do HC da Faculdade de Medicina da USP. • Consultório: rua General Furtado Nascimento, 740, cj 36 • Alto de Pinheiros – SP • Tel.: (11) 3024-7490 • E-mail: deswlo27@gmail.com
*Fabíola Custódio Flabiano Almeida é fonoaudióloga especializada em desenvolvimento infantil, distúrbios de deglutição e dificuldades alimentares. Doutora em Ciências da Reabilitação pela Faculdade de Medicina da USP. • Consultório: av. Angélica, 688 – cj 101 • Higienópolis-SP. • Tel.: (11) 4306-2242 • E-mail: fga.fabiolaflabiano@gmail.com
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