DE-SA-PE-GA: vender, trocar ou compartilhar

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Se a aplicação dos “3Rs” (reduzir, reutilizar e reciclar) é uma prática básica de quem defende propostas de sustentabilidade para a proteção do meio ambiente, o momento econômico impulsiona outros hábitos que garantem o acesso a produtos necessários por preços mais baixos e até objetos de desejo seminovos. Indiretamente, os 3Rs estão presentes nesse processo também.

Por Silvana Bezerra

Dê uma boa olhada em seus armários e verifique quantas coisas estão ali embaladas, guardadas, ocupando espaço sem qualquer uso. Não é difícil encontrar pessoas que compraram eletrodomésticos, roupas, sapatos, entre outros artigos, por impulso, e depois descobriram que não eram exatamente o que esperavam. Além disso, há inegavelmente, produtos extremamente úteis num momento e desnecessários em outro. Caso de artigos infantis.

Há cerca de 5 anos, surgiu a Butique Sustentável que organiza eventos para trocas. É uma experiência comunitária. Não se trata de vender coisas, mas trocar experiências inclusive. O encontro tem como público mulheres de todas as idades e artigos variados em tamanhos e estilos, pois a diversidade é que o torna especial e diferenciado.

Ninguém é dona do evento. O trabalho em equipe existe desde a pré-produção até a desmontagem, e cada uma contribui da forma que pode, pois acreditam nos valores que estamos espalhando: a mudança da sua relação com a roupa, não como objeto de consumo, mas como expressão da sua personalidade”, diz Luciana Sonck, criadora da Butique Sustentável.

Antes do evento, as interessadas separam as roupas ou acessórios que não querem mais, colocam uma etiqueta onde as pessoas possam escrever seus nomes e deixam num ponto de coleta. No dia do evento, as participantes já encontrarão as roupas organizadas em araras, prontas para serem experimentadas. Quem se interessa por uma peça coloca o nome na etiqueta. No final, se mais de uma pessoa se interessou pelo vestido, saia, ou o que for é feito um sorteio. Nenhuma peça pode conter mais que 4 nomes.

Toda a organização é feita por voluntárias que atuam no ponto de coleta, levam as roupas para o local do encontro, realizam a triagem do que está em bom estado, montam araras, organizam as músicas que serão tocadas no dia e divulgam nas redes sociais. O sucesso da Boutique Sustentável já gerou um segundo evento: a Boutique dos Pequenos para troca de artigos para crianças com idade até três anos, que aconteceu no dia 3 de novembro.

A casa da Maitê é um dos pontos de coleta. Maitê de Lara Sanches é socióloga e mãe de Maia, de seis meses – uma das inspirações do evento. Ela ressalta a importância do contato com outras pessoas, principalmente entre mães. Não se trata de um negócio. Vira diversão, onde é possível trocar um lenço por uma camisa ou uma bolsa. O valor monetário não é importante.

Inicialmente, os encontros eram restritos entre amigos. Por isso eram realizados na própria casa de Luciana Sonck. Com o crescimento do evento foi necessário buscar um lugar mais agradável e público como o Lotus Urbano, um templo de yoga e massagem. Localizado no quintal de uma casa centenária, com árvores frutíferas, flores e até um balanço em plena rua Bela Cintra. Não poderia haver local mais adequado para a proposta da boutique. Quem chega , além de trocar roupas, pode trazer café, bolo, biscoitos e compartilhar com os presentes. Tudo isso sem abrir a carteira. Nessa boutique, aparentemente, a única moeda aceita é o bom senso.

Quem tem crianças pequenas em casa sabe bem como elas perdem roupas rapidamente. Daniele Spimpolo é mãe dos gêmeos – Nicolas e Arthur, de dois anos. O enxoval das crianças, previsto até os dois anos, foi todo comprado no exterior, quando o dólar favorecia as compras. Daniele conta que algumas peças foram vendidas sem uso, muitas com a etiqueta ainda.

Há cerca de um ano, após buscas na internet descobriu os “grupos de desapego”, em especial aqueles focados em mães e crianças. Nessa busca descobriu, o grupo “Tem de Tudo na Vila”, que reúne pessoas da região da Vila São Francisco e Osasco, principalmente, que promove a troca, a venda, a oferta de serviços e indicações. Isso facilita o encontro entre os interessados.

Daniele diz que é preciso ter consciência da diferença do que é novo ou seminovo. É importante que os usados estejam em bom estado. Ela já vendeu roupinhas e brinquedos dos filhos e um tapete entre outros objetos. Até o momento não comprou nada para uso pessoal, mas garante que não foi por preconceito. Foi por falta de interesse.

As trocas costumam ser feitas em locais públicos como uma padaria ou uma loja. Por questões de segurança, não é recomendável fazer isso na própria casa. Há quem deixe os objetos na portaria do prédio.

Outra participante do grupo “Tem de Tudo na Vila” é Rosana Gomes – dona da loja Vila Nananenê. Mãe de Maria Clara, ela acredita que os artigos infantis têm grande apelo para esse tipo de prática. Com R$ 85,00 comprou casaco, touca e cachecol para a filha. Por esse valor, dificilmente compraria artigos novos e com a mesma qualidade, diz.

Na posição de vendedora, conta que também já fez bons negócios. Tinha um sapato pouco usado e decidiu colocá-lo à venda. “Era bonito, mas machucava o pé. Uma garota curtiu o modelo, mas não comprou. O namorado mandou uma mensagem para Rosana dizendo-se interessado. Ele queria fazer uma surpresa”. Para colaborar, Rosana conta que embalou os sapatos para presente. A menina deve ter ficado satisfeita.

Como comerciante, Rosana não vê problemas nesse tipo de prática. Acredita que há mercado para tudo. Ela, pessoalmente, oferece móveis infantis em sua loja e a oferta desse tipo de produto não é tão grande nos chamados grupos de desapego. Chama a atenção, entretanto, a oferta de outros artigos como carrinho, moisés e bebê conforto, comprados e descartados em pouco tempo.

Outro caminho para quem está interessado em trocas e vendas são os diversos grupos que existem nas redes sociais. Tem de tudo. Rodrigo Duques, de Osasco, quer trocar uma camisa do São Paulo tamanho GG, número 10, por bicicleta, celular, som, notebook, cadeira para bebê de até 2 anos e etc. Milton oferece rodas e pneus aro 15 para venda ou troca, juntos ou separados.

Um exemplar da revista Bravo, trazendo a manchete “O Holocausto de Polansky” foi trocado recentemente por um livro. Roberto Amaro troca uma bicicleta Houston novinha por um celular Moto G2 ou PS3.

Nesse universo não faltam aparelhos de ginástica como ergométricas, esteiras e outros para troca. Alguns, certamente, frutos de projetos pessoais para entrar em forma que não foram levados avante. Talvez seja o caso do aparelho de ginástica elíptico que pode ser trocado por um notebook com processador i5 ou i7. O dono diz que precisa “liberar espaço”.

Há curiosidades também, como a coleção de miniaturas de Kinder Ovo, organizada entre os anos de 2003 e 2005. O dono parece ter mudado de interesses. Quer halteres, barras com anilhas e banco de musculação.

No mesmo site há espaço para doação de animais. Encontramos dois cachorrinhos sem raça definida e 12 hamsters nessa condição.

Os novos ventos da economia podem estar incentivando as trocas, as vendas e os compartilhamentos, mas isso exige algum desapego. Se não usou por mais de um ano é sinal de que não tem utilidade e não fará falta. Verificar ao final de cada estação o que pode ser usado na próxima temporada e descartar o resto é uma alternativa para abrir espaço para o novo (ou seminovo). De quebra, é possível renovar o visual sem comprometer o orçamento. Já pensou nessa possibilidade?


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