Milão além da Catedral, Galleria Vittorio Emanuele e do Scala
No centro da moda e do design, há muito mais para ver e aprender.
Por Silvana Bezerra
Para ter uma visão geral da capital da Lombardia suba os 201 degraus do Duomo de Milão (a principal catedral, localizada no centro da cidade), alcance o terraço de oito mil metros quadrados e desfrute de um cenário ímpar. De lá é possível avistar a vizinha Galleria Vittorio Emanuele, a Torre Velasca, o Museo Novecento e os arranha-céus de Porta Nuova. A quantidade de degraus assustou? Reserve alguns euros e economize o fôlego: suba de elevador.
A visão do alto é apenas um aperitivo. Há muito mais para ver. Num continente onde as construções são testemunhas de séculos de história, a Itália não é diferente, mas as novidades surgem de olhares atentos e ousados de quem se inspira no antigo para moldar o presente e o futuro.
Não é por acaso que Milão é o destino certo dos fashionistas e parada obrigatória para quem trabalha com design e, por isso mesmo, é em Milão que acontece os mais importantes eventos desses setores. O Salão do Móvel, por exemplo, é considerado o mais importante do mundo e acontece na cidade, assim como o primeiro desfile do calendário anual da moda.
A principal catedral de Milão, entretanto, faz parte da lista de “visitas obrigatórias”. Não é só o terraço que merece atenção. Há muito que ver no seu interior, afinal a obra durou mais de 400 anos. No lugar onde anteriormente encontrava-se a Basílica de San Ambrogio desde o século V d.C até 836 quando foi acrescentada a Basílica de Santa Tecla, ambas destruídas em um incêndio em 1075.
A fachada é toda revestida em mármore branco-rosa. No topo há uma série de pináculos e agulhas decoradas com estátuas que contemplam a cidade. No ponto mais alto está a Madonnina – uma estátua de Giuseppe Perego, folheada a ouro, datada de 1774. Internamente, a construção também impressiona. A catedral de Milão está entre as maiores do mundo. Tem cinco naves e capacidade para 40 mil pessoas. Os visitantes ainda podem ver os esqueletos de vários santos com seus melhores hábitos, belos vitrais e a estátua do Apóstolo Bartolomeu. Uma visita guiada é a melhor opção para conhecer em detalhes a história da catedral.
O nome Galleria Vittorio Emanuele é uma homenagem ao primeiro rei da Itália. A cúpula, de 47 metros de altura, consumiu sete milhões e 850 mil m² de vidro e 353 toneladas de ferro. Inaugurada em 1877, abriga cafés, restaurantes históricos e lojas de grife. Todos os estabelecimentos são obrigados a ostentar o nome em dourado sobre fundo preto (nem a popular loja de fast food americana escapou dessa regra). Durante a Segunda Guerra foi quase que completamente destruída e, depois, recuperada com todo seu esplendor, o que a torna mais curiosa ainda.
Os moradores locais que atravessam a galeria às pressas em direção à Praça Scala talvez nem se rendam mais à sua beleza, mas para o visitante é impossível não notar a cúpula e o piso em mosaico. Mais, procure pela figura de um touro no mosaico, pise os testículos do animal com o calcanhar do pé direito e gire três vezes. Dizem que dá sorte. É mais uma das superstições italianas que todo mundo repete.
E já que estamos perto, outro ponto de interesse é o Teatro alla Scala, inaugurado em 1778 onde antes havia uma igreja gótica. A igreja do século XIV era dedicada à Santa Maria della Scala. Foi o primeiro teatro do mundo a ter energia elétrica. A companhia elétrica italiana Edison acendeu 2.450 lâmpadas iluminando o espetáculo de estreia daquele ano: a ópera Gioconda.
A obra toda foi financiada pelas famílias nobres de Milão que compraram os camarotes antes do teatro ficar pronto. Essa era outra novidade. A sala, em forma de ferradura de cavalo, inaugura o estilo italiano de teatro, onde as ‘arquibancadas’ são substituídas por camarotes e galerias e a profundidade do palco permite o uso de cenários mais complexos.
Os espetáculos, porém, não eram os únicos interesses dos donos dos camarotes. Usavam o espaço também receber convidados, comer, fazer negócios e jogar, o que só era permitido em teatros. Parte da arrecadação ia para as produções.
Aliás, na história do teatro, se destaca o nome de Carlos Gomes, primeiro compositor brasileiro a ter suas obras apresentadas no Teatro alla Scala. Estreou com “O Guarani”. No museu do teatro, entre Maria Callas e Renata Tebaldo, encontramos o busto do brasileiro.
A moda e os milaneses
Quer observar os milaneses mais de perto? Procure um café, um bar ou restaurante (aqueles com mesinhas externas são perfeitos) e, sem pressa, peça um Spritz (prosecco, Aperol e uma fatia de laranja) ou um bicchiere di vino rosso ou bianco. Se estiver friozinho, e preferir, vá de cappuccino.
Conhecer o jeito de viver e pensar dos milaneses demanda tempo, mas seguir um roteiro diferente dos tradicionais pode nos levar a novas descobertas, mesmo numa cidade da qual podemos ter a impressão de saber tudo. É o que prometem Clara Garmendia e Camila Leonelli. Ambas são jornalistas especializadas em moda. Clara aproveita a experiência como fotógrafa de street style para detectar e falar sobre as tendências que transitam pelas ruas antes de chegar às passarelas. Não se trata de um curso de moda como outros que podem ser frequentados na Itália. Trata-se de uma imersão num universo onde cultura, arte, design e moda se fundem. A dupla explica: o lifestyle, os cheiros, sabores, formas, texturas e cores fazem parte da cultura italiana, e a ideia é que cada um dentro da sua vivência busque inspiração criativa e comece a vivenciar as ruas com outro olhar.
O curso (ou vivência) se divide em três módulos que focam na história, características e influência da moda italiana pelo mundo; no quadrilátero della moda, Navigli, Brera, Porta Venezia, Porta Nuova e Isola, ou seja, a moda pelas ruas de Milão (incluindo, claro, as grandes grifes) e na identificação das tendências e do consumidor, e nas principais concepts stores e brechós da cidade e seus públicos.
O Quadrilátero D’Oro
Nos limites das vias Sant’Andrea, Della Spiga, Gesù, Borgospesso, Santo Spirito, Verri e Montenapoleon, entre ruas e calçadas estreitas, encontramos os palazzos e butiques exclusivas das marcas mais famosas e caras do mundo, como: Prada, Miu Miu, Valentino, Gucci, Versace, Bulgari, Marni e Dolce & Gabana, entre outras. No quadrilátero, as marcas competem pelo layout também e as vitrines parecem cenários de espetáculos teatrais. Outro motivo para visitar a região.
A Manzione Armani ocupa 600 m² e reúne todas as linhas da marca: moda, casa, beleza e arte, mas oferece também café, restaurante e livraria. É um lugar para passar horas namorando os móveis, os perfumes e os sapatos.
A 10 Corso Como oferece uma seleção requintada e moderna de design, moda, arte e objetos de desejo da cidade num misto de galeria, livraria e loja multimarcas. É considerada a “mãe de todas as lojas conceito”. Vende peças especialíssimas de etiquetas como Marni e Comme des Garçons, além de acessórios, perfumes e maquiagem. Abriga também um pequeno hotel, um café/restaurante e um terraço. A loja possui um outlet não muito longe dali. Vende peças únicas de coleções passadas, por preços mais baratos.
Esticando um pouco mais a viagem…
A Itália é um daqueles lugares onde acabamos sempre desejando ficar um pouco mais, seja pela história, pela rica gastronomia ou pelas maravilhosas paisagens, com muitas opções. Uma delas é conhecer Turim (ou Torino como dizem os italianos).
A cidade é a capital do Piemonte e está a 145 km de Milão, duas horas de carro ou uma de trem. É possível ir e voltar num mesmo dia e, como as principais atrações estão próximas, dá para fazer um tour a pé.
Entre os principais prédios históricos estão o Palazzo Reale di Torino, o Palazzo Carignano e o Palazzo Madama. O Palácio Real de Turim é Patrimônio da UNESCO desde 1997. Foi a casa da família Savoy que dominou a região por mais de três séculos. Sua decoração reflete o gosto barroco das famílias que dominavam a Europa no século XVI.
Nos salões e quartos destaca-se o uso farto do ouro e pedras preciosas na decoração; o estilo arquitetônico tem semelhança com o de Versalhes, com a sala do trono, salas de jantar, dança e tapeçarias que cobrem as paredes dos quartos.
Turim também abriga uma das principais coleções de artefatos egípcios do mundo. Só perde para o Museu do Cairo em importância. Com quase 200 anos de existência, ele guarda 6.500 peças dessa antiga civilização, que vão de estátuas de deuses a sarcófagos, passando por vasos e manuscritos em papiro.
Na cidade da Fiat não poderia faltar o Museu do Automóvel. Lá estão expostos desde o primeiro modelo de carro a vapor até os carros de Fórmula 1 de hoje. Todos eles são caracterizados por cenários que ilustram a época de cada um. Quem sonha em dirigir um carro de corrida pode experimentar o de Fórmula 1 em alguns dos circuitos mais famosos do mundo como Monza, Barcelona, Spa Francorchamps, entre outros, através de um simulador semiprofissional. A percepção da superfície da pista, a sensibilidade à aceleração e frenagem são tão realistas que fazem qualquer um se sentir um verdadeiro piloto.
Quem quiser buscar alguns momentos de relaxamento, caminhadas e pedaladas às margens do Rio Pó são boas opções, mas o Parque do Valentino também vale uma visita. Dá até para fazer piquenique, como as famílias locais. No parque há também um burgo medieval cenográfico. A construção é do século XIX, mas dá uma boa ideia de como era a vida na Idade Média. Há casas, bodegas, reproduções de artesanato e até uma residência nobre da época (chamada Rocca) com seus móveis, armas da época, tudo reproduzido fielmente.
Para encerrar a visita ou levar o “gostinho de Turim” para casa, não esqueça, a cidade é berço do gianduia, que surgiu da necessidade. Durante o “bloqueio do cacau”, imposto por Napoleão, os mestres chocolateiros de Turim decidiram substituir o cacau por farinha de avelãs torradas, criando a receita que acabou conquistando os paladares pelo mundo.
Os lagos do norte da Itália
Os lagos italianos ficam especialmente bonitos durante os meses de primavera e verão, mas os preços sobem com a temperatura que pode chegar a 40 graus e as filas aumentam em todos os lugares. No inverno, os preços baixam bastante, mas as chuvas são mais frequentes. No outono tem temperaturas frias à beira do lago e preços melhores. Pode ser um bom período para conhecer Guarda, Como e Maggiore.
O Lago di Garda é o maior da Itália. Localiza-se entre as regiões de Lombardia, Vêneto e Trentino-Alto Adige; a 140 km de Milão, 37 km de Verona e 160 km de Veneza. Possui uma área de 370 km². No seu entorno, os povoados se destacam por suas atrações e beleza. Quem gosta de agito tem em Sirmione um destino certo. É comparado a um parque de diversões, recebe um turismo massificado. O maior problema é encontrar uma vaga para estacionar, mesmo pagas. O Castello Scaligero di Sirmione é um dos cartões postais da cidade.
No complexo arqueológico Grotte di Catullo está o maior e mais luxuoso edifício privado do Império Romano. É considerado um importante exemplo da arquitetura romana e sua técnica construtiva. As águas termais de Sirmione também são famosas por curar diversos males, principalmente os respiratórios.
Limone Sul Garda é menor e bem mais tranquila. Destaca-se por seus jardins de limões e suas ruelas coloridas. Aproveite para tomar um Limoncello apreciando a paisagem. Riva Del Garda, mais ao norte do lago, oferece maravilhosas vistas panorâmicas. É o lugar certo para a prática de wind surf e vela. Por isso é sede de inúmeros campeonatos. Em Malsine, a atração é o bondinho Funivia del Monte Baldo. As cabines são giratórias e oferecem uma visão de 360 graus da região. Do alto, o turista consegue ter ideia da imensidão do Lago di Garda.
Bardolino é a cidade para os amantes do vinho e do pôr do sol. Uma combinação perfeita para contemplação. Algumas vinícolas oferecem degustação e oportunidades para conhecer mais do turismo rural.
O Lago di Como fica a 50 km de Milão. Formado pelas águas das geleiras derretidas tem forma de “Y” e é um dos lagos mais profundos da Europa, atingindo 414 metros de profundidade. Os barcos públicos percorrem as 40 cidadezinhas ao redor do lago, mas os destinos mais procurados são Bellagio, Laglio e Varenna.
Bellagio fica exatamente no encontro dos três braços do “Y”. No final da antiguidade, a região já era procurada como um lugar de férias pelas famílias patrícias romanas por conta de seu clima. Assim como outros povoados, Bellagio se destaca pela paisagem, pelas ruas e escadarias estreitas e seu colorido. Varenna fica praticamente em frente a Bellagio.
Em Laglio, a paisagem não difere muito das cidades vizinhas, mas a presença do ator George Clooney no pedaço provocou uma verdadeira onda de turistas para o local. Dizem que 90% dos milaneses vão a Laglio para praticar esportes, corrida ou ciclismo, mas 90% dos turistas vão para conhecer a Villa Oleandra – a casa de verão de George Clooney.
O complexo de Villa Oleandra está presente nos mapas cadastrais de Laglio desde 1720, mas sofreu inúmeras modificações até os dias atuais. O prédio é cercado por um grande parque botânico e já hospedou inúmeras celebridades de Hollywood. Há quem diga, entretanto, que o ator teria colocado a casa à venda por falta de privacidade, mas ninguém confirma se o lugar já tem outro dono.
O Lago Maggiore é o segundo maior da Itália e atravessa a fronteira com a Suíça. Está situado no lado sul dos Alpes. É palco de inúmeros eventos musicais ao longo do ano. O local é o preferido de famílias nobres da Lombardia. Os Borromeus, por exemplo, tornaram-se proprietários de um arquipélago formado pelas ilhas Bella, com seu Palazzo Borromeo do século XVII, cercado por jardins cenográficos; Pescatori, Madre, conhecida por seu jardim botânico rico em plantas raras, e San Giovanni.
Isola Madre e Isola Bella, consideradas “irmãs”, são muito frequentadas por turistas que procuram os palácios esplêndidos e seus jardins, famosos em todo o mundo pelo paisagismo e variedade de plantas.
A região ainda não está entre as mais exploradas pelos brasileiros, mas a paisagem é inspiradora e nos remete à vocação de Milão para a criação, seja na no campo das artes, da moda ou do design. Boa viagem!
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