Benefícios da natureza no desenvolvimento infantil
Neste mundo tão cheio de perigos que vivemos temos a tendência de querer proteger nossos filhos da violência da cidade, de infecções, da sujeira e das más influências. Cada vez mais as crianças são deixadas na segurança da escola ou de casa, passando boa tarde do tempo imersos no mundo digital. Bebês de poucos meses já apresentam a incrível capacidade de passar horas atraídas a “vídeos educativos” e aprendem facilmente a manipular tablets e celulares. Afinal de contas, isso desenvolve a inteligência?
Por Dra. Denise Swei Lo
É inegável que a infância atual mudou muito em relação a poucas décadas anteriores. Portanto, para discutir este assunto, o artigo foi redigido baseado no “Manual de Orientação do Grupo de Trabalho em Saúde e Natureza da Sociedade Brasileira de Pediatria”.
Benefícios do brincar e do aprender na natureza
Pesquisas científicas têm demonstrado que a falta de oportunidade de brincar e aprender no contato com a natureza podem estar relacionados aos índices crescentes de obesidade infantil, hiperatividade, falta de equilíbrio, miopia etc. Estes problemas podem se estender na adolescência e vida adulta, levando à sequelas cardiovasculares, hipertensão arterial, diabetes, aumento de colesterol, triglicérides, risco de dependência de álcool e drogas, depressão, ansiedade, transtornos do sono e mortes prematuras. A boa notícia é que, paralelamente, outros estudos mostraram que o convívio com a natureza foi benéfico para o controle destas condições.
Os benefícios do contato com a natureza favorecem também o desenvolvimento neuropsicomotor, reduzem os problemas de comportamento, proporcionam bem-estar mental, ajudam a desenvolver a criatividade, a iniciativa, a autoconfiança, a capacidade de escolhas e decisões, a coordenação psicomotora, o desenvolvimento de linguagem, auxiliam na síntese da vitamina D, reduzem o número de doenças e visitas ao médico. Mais ainda, desenvolvem a ética e a sensibilidade, tão carentes nos nossos dias, capacitando a arte da empatia, do encantamento, da humildade e do senso de pertencimento.
A natureza pode ser encontrada em vários ambientes, construídos ou não, preferencialmente a céu aberto: pedras, chão de terra, água, mar, rios, plantas, árvores, insetos, pássaros, formas espaciais (céu, sol, lua, estrelas e horizonte). Pode ser encontrada em parques, praças, hortas urbanas, jardins etc. Deve-se, obviamente, evitar áreas degradadas e de risco à saúde e segurança da criança.
Nos meses frios de outono e inverno, a tendência geral das famílias é manter as crianças em ambientes fechados. É importante manter lactentes jovens, abaixo de 3 meses, protegidos em casa. Porém, crianças maiores, desde que devidamente agasalhados, podem e devem sim ter contato com a natureza. São nos ambientes fechados de supermercados e shopping centers, onde aumentam a concentração de vírus respiratórios nesta época do ano.
Recomendações gerais da Sociedade Brasileira de Pediatria
🌼 As crianças e adolescentes devem ter acesso diário, no mínimo por uma hora, às oportunidades de brincar, aprender e conviver com a – e na – natureza, para que possam se desenvolver com plena saúde física, mental, emocional e social.
🌼 Responsáveis, cuidadores, educadores e pediatras devem estar atentos sobre as especificidades da relação com a natureza em cada faixa etária: crianças entre 0-7 anos, 7-12 anos e adolescentes. No caso das crianças pequenas, o foco deve ser no livre brincar, no movimento de ir além, nas experiências sensoriais e no papel do adulto como um companheiro de exploração e descobertas, o que ao mesmo tempo fortalece o binômio pais-filhos.
Já as crianças maiores estão em busca de aumentar seu raio de exploração, de curiosidade, de autonomia, de lidar com o risco percebido e de alcançar a competência ao lado de seus amigos. O adolescente é uma pessoa em busca de desafios, aventuras e convivência social entre pares.
🌼 As escolas e instituições de cuidados devem organizar suas rotinas e práticas de forma a equilibrar o tempo destinado às atividades curriculares com o tempo livre (recreio), a fim de permitir que as crianças e os adolescentes tenham amplas oportunidades de estar ao ar livre, preferencialmente em ambientes naturais, em contato com plantas, terra e água. Diversos estudos e exemplos mostram que mais tempo de recreio beneficia diretamente o aprendizado e o comportamento dos alunos nas escolas.
🌼 Escolas, educadores e responsáveis devem permitir os riscos benéficos nos quais as crianças e adolescentes se engajam por livre escolha, conseguindo dimensionar as consequências e lidar com elas.
🌼 Os adultos devem compartilhar seu apreço pela natureza e pelas atividades de lazer ao ar livre pautadas pelas relações, pelos encontros, pelo movimento e também pela contemplação e momentos de relaxamento.
🌼 As crianças e adolescentes devem ser orientados no sentido de buscarem o equilíbrio no qual tanto o uso da tecnologia como a conexão com o mundo natural prosperem de forma benéfica, contribuindo para o seu desenvolvimento e bem-estar.
🌼 A alimentação deve ser vista pelas escolas, famílias e outras instâncias como uma importante estratégia de fomento da relação entre a criança e a natureza, especialmente por meio do processo de plantar, cultivar, colher e preparar alimentos.
🌼 O poder público deve garantir que todas as crianças e adolescentes tenham acesso à áreas naturais, seguras e bem mantidas, a uma distância inferior a 2 km de suas residências.
🌼 Pediatras, famílias, educadores e gestores públicos devem ter consciência de que os benefícios são mútuos: assim como a criança e o adolescente precisam da natureza, a natureza precisa das crianças e jovens. Ter essa clareza é importante para apoiar, conceber e priorizar estratégias que visem promover a reconexão entre as crianças e jovens e o ambiente natural.
Referência Bibliográfica
- Benefícios da Natureza no Desenvolvimento de Crianças e Adolescentes. Manual de Orientação do Grupo de Trabalho em Saúde e Natureza. Sociedade Brasileira de Pediatria. 2019.
*Denise Swei Lo é médica pediatra (CRM: 75.590), chefe da Enfermaria de Pediatria do Hospital Universitário da USP e coordenadora da Residência Médica em Pediatria do HC da Faculdade de Medicina da USP. • Consultório: rua General Furtado Nascimento, 740, cj 36 • Alto de Pinheiros – SP • Tel.: (11) 3024-7490 • E-mail: deswlo27@gmail.com
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